A GUARDA COMPARTILHADA COM ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIAS

A GUARDA COMPARTILHADA COM ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIAS

A Lei 13.058/2014 provocou no Brasil um verdadeiro alvoroço juriscultural em referência ao que era entendido e adotado até então sobre a guarda dos menores.

Tal diploma veio ampliar o conceito daquilo que o Código Civil de 2002 definiu como “guarda compartilhada”, consolidando esse modelo como a regra a ser aplicada, e não a exceção.

Acuso aqui a opinião de que a guarda compartilhada propõe o compartilhamento equânime entre os pais separados (ou que nunca foram casados ou companheiros) da convivência e de todas as responsabilidades relacionadas à vida do menor, sendo ambos os guardiões da criança, enquanto que a guarda unilateral delega claramente o papel de guardião para apenas um dos pais e concede ao outro o mero direito de visitação.

Tendo em vista tratar-se de tema metajurídico, é fundamental que integremos à discussão uma análise filosófica e psicológica da realidade contemporânea, porque sem a qual se torna irrealizável transpor os paradigmas tão fortemente fixados em nossa cultura. Exemplo disso se dá quando ouvimos nas ruas a “ordem” de que a guarda dos filhos cabe à mulher, justamente pela influência da figura cristã da maternidade como estado de graça.

Se essa incoerência fosse uma realidade, como trataríamos da guarda nas relações homoafetivas? E o que falar dos anos de luta feminista pela igualdade de gêneros, teria sido em vão?

Pois bem, ainda que nos consideremos cidadãos contemporâneos e entendamos que a guarda deva ser compartilhada, há algo a ser superado: onde é que o menor irá residir?

Tempos modernos também nos apresentam problemas modernos e nessa combinação, de guardas e residências, que é importante refletirmos para construirmos uma nova cultura de guarda de menores no Brasil.

Pacífico é o entendimento de que a guarda compartilhada não é sinônimo de alternância de residências, porém, esta como decorrência daquela é medida salutar, desde que não afete negativamente as atividades cotidianas do menor.

Infelizmente, no Brasil não existem pesquisas a respeito dos reflexos sobre a criança que convive no modelo de guarda compartilhada com duas residências, mesmo porque são inabituais as decisões de fixação de residências alternadas ou simultâneas. Contudo, nos diversos países em que foram realizados esses estudos, os resultados têm se mostrado muitíssimo favoráveis ao modelo de residências simultâneas, inclusive, é o modelo mais popular em todo o mundo ocidental.

Essas pesquisas científicas demostram que a maioria das crianças em regime de custódia conjunta, convivendo com ambos os pais, semanalmente, em igualdade de tempo, apresentaram níveis significativamente mais altos de satisfação de vida, maior bem-estar geral, autoestima, melhores resultados acadêmicos e relacionamentos psicossociais. E a razão encontrada pelos pesquisadores é a de que essas crianças não estão privadas de sua liberdade por atos de alienação parental.

Curiosamente, os pesquisadores descobriram que o litígio tende a desaparecer na custódia física conjunta e dividida de forma equilibrada, e as crianças só tendem a se beneficiar quando as relações parentais passam a ser cooperativas, sem disputas legais prolongadas.

Note que a guarda é um compromisso com o desenvolvimento de um indivíduo em formação e, para tanto, essa criança deve conviver, necessariamente, com a realidade de ambos os genitores, nos seus eventuais novos núcleos familiares e nos círculos socioafetivos que se formam na vida de ambos os pais.

Uma das causas positivas desta mudança de padrão é que homens e mulheres estão percebendo a importância da convivência entre pais e filhos, além de que, cada vez mais os homens querem ter um papel participativo (e não secundário) na vida da criança.

Outro argumento para o crescimento de decisões judiciais no sentido de aplicação dessas regras relaciona-se com o aumento de mães que trabalham em tempo integral, ou seja, casais que estavam sentindo a sobrecarga do cotidiano familiar bem antes da separação, e já achavam que deveriam cooperar mais conjuntamente para gerenciar as necessidades de assistência à infância dos filhos.

É importante ressaltar que esse modelo de convivência, em que a criança se reveza entre duas residências, sempre recebeu duras críticas e sofreu forte resistência. Dizem que a criança está sempre na casa do pai ou na casa da mãe, nunca se sentindo em casa; que ela desenvolve dupla personalidade, tendo que conviver a cada período com regras e hábitos diferentes. Chamam-na de “mochileira”, numa alusão à mochila que sempre precisa estar carregando, com objetos pessoais seus, que leva de uma casa para a outra.

Pondera-se que os juízes não costumam decretar guarda compartilhada com residências alternadas sem que esta seja uma solicitação expressa dos pais, com a qual ambos estejam de acordo. E, quando a decreta, é frequente estabelecer um prazo para que a decisão possa ser revista, após estudos técnicos psicológicos que deem uma ideia de como aquele filho estava sendo afetado por aquela opção.

Apesar da resistência de parcela da doutrina e da jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu pela fixação da alternância de residências como expressão definitiva da guarda alternada.

Por fim, frente à legislação pátria, fatos, pesquisas e vivências, a verdade é que subestimamos a capacidade da criança de se adaptar às diferenças e o quanto somos preconceituosos quando avaliamos tão mal uma nova proposta. A criança que vive entre duas casas, além de lucrar com a convivência e igual possibilidade de trocas com ambos os genitores, aprende rápido que as diferenças existem e devem ser respeitadas. E ainda, desenvolvem bem antes das outras a sua opinião própria e seu raciocínio lógico. Ademais, elas se sentem sim em casa, em ambos os ambientes!

Sabrina Maia de Oliveira do Amaral

Escrito por:

Sabrina Maia de Oliveira do Amaral

Advogada especialista em Direito de Família e Sucessões.

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